Em 2009, o goleiro Léo Higuita foi contratado para atuar no Kairat Almaty, atendendo a um convite de um amigo com experiência na liga local e deixando de lado propostas menos vantajosas de Portugal e Itália. Ele mal sabia que ali iria começar uma trajetória transformadora, com sua presença sendo a precursora para um novo momento do futsal cazaque.
Quatro anos depois de chegar ao país da Ásia Central, Léo, hoje no Semey, se naturalizou, ajudando a liberar uma vaga de estrangeiro para seu time, que não atravessava um bom momento, com a decisão também contribuindo para fortalecer o campeonato.

Sua estreia pela seleção cazaque aconteceu em 2014, com o jogador já tendo completado mais de 100 jogos pelo time nacional. "Foi uma escolha muito boa, não me arrependo de forma alguma. Claro que minha ideia era chegar no país e criar raízes, mas nunca imaginava que me naturalizaria.
"Foi algo natural, mas precisei tomar a decisão de não atender a uma convocação do Brasil. Precisei escolher. Foi um gesto para retribuir o time e o país que me colocaram na vitrine", lembra o goleiro, que já tinha, neste período, conquistado uma liga cazaque, preferindo agir de forma recíproca, tendo uma realidade mais estável do que nos tempos de Brasil.

Abrindo caminhos
Léo Higuita foi o primeiro brasileiro a defender a seleção do Cazaquistão, sendo acompanhado de perto também por Douglas Junior e Léo Jaraguá. Para defender o país, o atleta precisa jogar na liga local por cinco anos seguidos, determina a FIFA. O técnico da seleção também é brasileiro: Paulo Ricardo Figueiró Silva, o Kaká, foi o responsável por levar a equipe às semifinais do Mundial em 2021.
Os reforços brasileiros no time nacional, que chegaram a ser cinco, fizeram a diferença para que a seleção se destacasse no cenário internacional, conquistando a medalha de bronze na Euro de 2016.

Nas Eliminatórias da Euro 2016, o Cazaquistão venceu Portugal, então campeão mundial, um resultado histórico diante de uma potência para mostrar as reais condições de bater de frente com tradicionais países do futsal. Além disso, o país disputou duas semis de Euro seguidas e chegou em três Mundiais consecutivos.
"Os brasileiros foram a cereja do bolo, chegamos para levar o país a um nível diferente. Os resultados fizeram o país criar uma identificação importante com a modalidade, é o esporte coletivo mais popular do Cazaquistão quando o assunto são resultados.
"A contribuição dos brasileiros foi grande para fortalecer a seleção e tornar a liga mais popular", cita, lembrando que o Campeonato Cazaque está entre os cinco ou seis melhores do mundo. Dos 11 clubes do país, 10 contam com brasileiros.

Contribuição dentro e fora das quadras
Além de jogadores, o Cazaquistão investiu em técnicos e integrantes de comissão técnica brasileiros, que puderam agregar valor e conhecimento ao futsal local, que agradece a presença estrangeira para chegar a um novo patamar.
"Sinto um grande orgulho de ter feito parte desta transformação. A presença dos brasileiros foi essencial para desenvolver o esporte. Alguns países contam com brasileiros, mas não evoluíram da mesma forma. O Cazaquistão se mostrou disposto a investir e contar com profissionais de alto nível dentro e fora de quadra para gerar um legado de excelência no futsal", analisa Higuita.

"Higuita é Deus"
Entre os que viram de perto o boom do futsal no Cazaquistão está o preparador físico Neto Pereira, que trabalha no Semey. "Eu já tinha ouvido várias coisas sobre a importância do futsal no Cazaquistão, mas só tive a real noção do alcance quando cheguei aqui.
"É o esporte coletivo mais popular do país, os jogos da liga am ao vivo em horário nobre em TV aberta. Os ginásios são lotados, a torcida trata todos como heróis, só vendo para ter noção. Quando cheguei, pude ver como eles são tratados como super stars.
"Os atletas, em especial o Higuita, que já foi eleito melhor goleiro do mundo por cinco vezes, é um verdadeiro Deus. Ele não anda cinco metros na rua sem tirar uma foto. Muitos brasileiros estão aqui há mais de uma década e a inserção na seleção foi natural. A relação Brasil-Cazaquistão só expande a cada dia", afirma.
O Semey, de Neto e Higuita, é treinado por Davi Mendonça, desde julho de 2023, com o técnico mais um brasileiro a ter sucesso no país. "O fato de mais treinadores brasileiros estarem aqui vem dando outro nível aos jogos. O Kairat era campeão há 21 anos seguidos e sua hegemonia foi quebrada com ajuda de um técnico brasileiro. Isso fortaleceu os trabalhos dos treinadores brasileiros e consequentemente o nível da liga", comemora Neto.

Champions League
No Cazaquistão, os brasileiros têm a chance de disputar a Champions League, a maior competição de clubes do planeta, colocando uma experiência para poucos no currículo.
A estrutura chama atenção pelo alto nível de quadras, hotéis, centros de treinamento e condições para que os atletas se preocupem em desempenhar seu melhor no torneio internacional.
"Fiquei impressionado com o cuidado e organização da UEFA com a competição. Hotéis, ginásios, reuniões, documentos de instrução competitiva, tudo do mais alto nível", conta Neto Pereira, que chegou no país há apenas seis meses e reúne experiência no futebol de campo em clubes como Avaí e Confiança.
